Neste mês de julho, faz 42 anos que me formei médico. E recentemente fui questionado sobre qual o ingrediente principal na prática da medicina. Certamente é a humanização. Ao refletir sobre essas mais de quatro décadas de cuidado aos pacientes renais crônicos, lembrei-me de como a humanização foi essencial em nossa história e em nosso jeito de cuidar, quando demos início ao nosso trabalho no Centro de Tratamento de Doenças Renais e depois na Fundação Pró-Rim.
Quando começamos, já tomávamos algumas atitudes dentro da diálise como foco especial no conforto dos nossos pacientes. Isso foi há muito tempo antes de se falar em trabalho humanizado. Nada mais era do que dar carinho e atenção aos nossos pacientes, oferecendo a eles um tratamento digno, não interessando se eles podiam ou não pagar por isso, ou se tinham convenio ou não. E continuamos assim até os nossos dias. Na medida em que fomos atuando desta forma, ou seja, recebendo a todos que vinham fazer diálise, com um bom dia afetuoso, ou um abraço apertado, sentíamos que os pacientes cada vez mais acreditavam no nosso trabalho e que a melhoria no ambiente era indiscutível e gratificante para todos.
Lembro-me com muita emoção quando um paciente iria fazer sua primeira sessão de hemodiálise e me disse “Doutor Hercílio, estou com medo. Pode ficar de mãos dadas aqui comigo?” e eu fiquei as quatro horas de sua temível sessão ao seu lado.
Eu sempre digo que, com minha experiência no tratamento destes pacientes renais crônicos, há quase 45 anos “um passar de mão na cabeça, uma palavra carinhosa e amiga, resolvem quase 75 por cento dos seus problemas”. A nossa experiência – minha e do meu amigo e parceiro Dr. José Aluísio Vieira – foi bem sucedida e, então, começamos a montar uma equipe multidisciplinar quando ninguém falava nisso. Começamos com uma enfermeira, depois psicóloga, nutricionistas, assistentes sociais e até terapeutas ocupacionais. O objetivo dessa atuação global? O atendimento humanizado e focado nas necessidades globais do paciente renal.
Esta equipe foi montada e sustentada durante anos pelo próprio serviço de hemodiálise e após uns 10 anos o SUS, por força de portaria, determinou que os serviços contratassem estes profissionais. Mas há muito nós já estávamos à frente com esse olhar essencial para a humanização. O objetivo deste grupo era ajudar no tratamento dos pacientes. Esta experiência vivenciada por nós foi maravilhosa. Aliadas à equipe, outras benfeitorias foram se agregando, como nosso ambulatório pioneiro em transplante renal, nossa técnica em segurança, enfim, pessoas preparadas para melhorar cada vez mais este serviço.
Criamos nossa missão que era e continua sendo salvar vidas e oferecer um tratamento digno e humanizado ao paciente renal. Mas era preciso disseminar esse valor. Sempre quisemos que todos que trabalhassem nessa causa tivessem a humanização como marca. A educação, nesta fase, teve um aspecto fundamental. Ensinávamos aos nossos funcionários como agir com humanização. E, o principal recado era que o paciente deveria, acima de tudo, ser tratado com o máximo respeito e atenção.
Para nós, médicos, o aprendizado foi igual e nós mesmos nos convencemos que este era o melhor caminho e fazia parte do tratamento. Em retribuição, começamos a disponibilizar os nossos colaboradores com bolsas de estudo, cursos, ida a congressos, entre outros estímulos. Nosso crescimento foi muito rápido e hoje me recordo quando comecei a trabalhar com o Dr. José Aluísio Vieira, que já estava na cidade há seis anos, após ficar cinco anos estudando nos Estados Unidos. Naquela época tínhamos apenas 12 pacientes e agora são mais de 1.200 pacientes que dependem do nosso tratamento humanizado. Ao olhar para essa história, sinto a certeza de que o amor sempre vale a pena. E a humanização sempre será o segredo do sucesso da melhor medicina!
Pretendo numa segunda etapa contar um pouco mais desta história linda que representa a nossa caminhada de muita luta e dedicação aos pacientes.
Dr. Hercilio Alexandre da Luz Filho
Fundador e ex-presidente da Fundação Pró-Rim